Derivadas de ordem \(n\).
Concavidades
Assíntotas.
Estudo de funções.
Material de estudo:
Definição de derivada de ordem \(n\). Seja \(n\in\mathbb{N}\). Define-se por recorrência, \[f^{(1)}=f', \qquad f^{(n)}=\left(f^{(n-1)}\right)'.\] Para \(n=0,\) define-se \(f^{(0)}=f.\)
A função \(f\) diz-se \(n\) vezes diferenciável se \(f^{(n)}(x)\) existe e é finita, para todo \(x\in D_f\).
A função \(f\) diz-se de classe \(C^n\) se \(f\) é \(n\) vezes diferenciável e a função \(f^{(n)}\) é contínua em \(D_f\).
A função \(f\) diz-se de classe \(C^\infty\), ou indefinidamente diferenciável, se tiver derivadas de todas as ordens em \(D_f\).
Relembre o exemplo da aula anterior de uma função diferenciável mas não de classe \(C^1\): \(f(x)=\begin{cases}x^2\cos\frac{1}{x},& x\not=0,\\0,& x=0 \end{cases}.\)
Para derivadas de ordem 2 e 3 também se pode escrever: \(\quad f''(x)=f^{(2)}(x)\quad\) e \(\quad f'''(x)=f^{(3)}(x).\)
Nos 3 exemplos a função \(f\) é de classe \(C^\infty\).
Para esboçar o gráfico de uma função, e também ter um critério alternativo de classificar os pontos de extremo (relativamente aos intervalos de monotonia), é importante conhecermos a concavidade da função. Para formalizar este conceito, vamos supor uma função diferenciável e classificar a concavidade da função num ponto \(a\) consoante, em relação à recta tangente em \(a\), o gráfico está acima (concavidade virada para cima) ou abaixo (concavidade virada para baixo).
Definição. Seja \(f\) diferenciável num intervalo \(I\). Diz-se que
- \(f\) é convexa em \(a\) ou tem concavidade virada para cima em \(a\) se, \[f(x)\geqslant f(a)+f'(a)(x-a),\quad \text{ para todo }x\text{ numa vizinhança de }a;\]
- \(f\) é côncava em \(a\) ou tem concavidade virada para baixo em \(a\) se, \[f(x)\leqslant f(a)+f'(a)(x-a),\quad \text{ para todo }x\text{ numa vizinhança de }a;\]
- \(f\) tem um ponto de inflexão em \(a\) se \(f\) muda de concavidade no ponto \(a\).
Exemplos. Sabemos, pelos respectivos gráficos, que \(e^x\), \(x^2\) são funções convexas, enquanto que \(-x^2\), \(\ln x\) ou \(\sqrt{x}\) são côncavas e \(x^3\) tem um ponto de inflexão em \(0\). O critério que serve para deduzir rigorosamente estes factos é baseado no uso da 2ª derivada.
Um caso importante é quando \(a\) é um ponto crítico de \(f\), ou seja, quando \(f'(a)=0.\) Relembre (reveja a 2ª parte do guia de estudo da aula teórica 18) que, se \(f\) é diferenciável em \(a\), estando a assumir que \(a\) é interior ao domínio, então, aquela é uma condição necessária para que \(f\) tenha extremo relativo em \(a\). No entanto, relembre que não basta (não é suficente). Pondo \(f'(a)=0\) na definição anterior e relembrando a definição de máximo e mínimos relativos, podemos escrever:
Proposição. Seja \(f\) diferenciável num intervalo \(I\). Seja \(a\in I\) tal que \(f'(a)=0.\) Então,
- \(f\) tem concavidade virada para cima em \(a\) \(\;\Rightarrow\;\) \(f\) tem mínimo relativo em \(a\),
- \(f\) tem concavidade virada para baixo em \(a\) \(\;\Rightarrow\;\) \(f\) tem máximo relativo em \(a\),
- \(f\) tem um ponto de inflexão em \(a\) \(\;\Rightarrow\;\) \(f\) não tem extremo relativo em \(a\).
Reparem que, neste ponto, não assumimos a existência de 2ª derivada. A definição e proposição anteriores são independentes da função ser ou não 2 vezes diferenciável. Mas, como sabem, o sinal da 2ª derivada, quando esta existe, é um auxiliar importante (não a definição!) para a determinação das concavidades. Vamos obter essa relação e ver, posteriormente, que também as derivadas de ordem superior podem ter uma palavra a dizer sobre a identificação de um extremo relativo.
Suponhamos que \(f\) é de classe \(C^2\) em \(I\) e que \(a\in I\). Defina-se \[ E(x)=f(x)-f(a)-f'(a)(x-a). \] Veja atrás a definição de concavidade: se, numa vizinhança de \(a\), \(E(x)\geqslant 0\), então \(f\) tem a concavidade virada para cima; se, em vez disso for \(E(x)\leqslant 0\), a concavidade será virada para baixo.
Repare agora que \(E(x)\) é de classe \(C^2\), que \(E(a)=E'(a)=0\) e que \(E''(x)=f''(x)\) em \(I\).
Suponhamos agora que \(f''(a)\gt 0\). Como \(E''(a)=f''(a)\gt 0\) e \(E''(x)\) é contínua (em consequência de \(f''(x)\) o ser, por hipótese) concluimos que, numa vizinhança \(V_{\varepsilon}(a)\), temos \[E''(x)\gt 0.\] Logo \(E'(x)\) será estritamente crescente nessa vizinhança, e como \(E'(a)=E(a)=0\) teremos,
Exercício: Repita o mesmo argumanto com as necessárias adaptações para o caso \(f''(a)\lt 0.\)
Obtemos assim:
Teorema. Seja \(f\) uma função 2 vezes diferenciável num intervalo \(I\) e \(a\in I\). Então,Em consequência disto, se \(f'(a)=0\), então
- \(f''(a)\gt 0\) \(\;\Rightarrow\;\) \(f\) tem concavidade virada para cima em \(a\),
- \(f''(a)\lt 0\) \(\;\Rightarrow\;\) \(f\) tem concavidade virada para baixo em \(a\).
- \(f''(a)\gt 0\) \(\;\Rightarrow\;\) \(f\) tem mínimo relativo em \(a\),
- \(f''(a)\lt 0\) \(\;\Rightarrow\;\) \(f\) tem máximo relativo em \(a\).
Observação importante: Reparem que para o caso \(f''(a)=0\) nada é dito neste teorema. De facto, nenhuma conclusão sobre a concavidade se pode tirar nessa situação. E, além disso, se \(f'(a)=f''(a)=0\) nada sobre a existência de extremo neste ponto se pode concluir como, aliás se pode ver com os exemplos \(x^2\), \(-x^2\), \(x^3\). Todos satisfazem \(f'(0)=f''(0)=0\), sendo que, em cada caso, \(f\) tem, respectivamente um mínimo, um máximo e um ponto de inflexão no ponto \(0\).
No entanto, é fácil ver que este teorema pode ser complementado com o seguinte:
Nas condições do teorema anterior,Em consequência disto, se \(f'(a)=0\), então
- \(f''\) muda de sinal em \(a\) \(\;\Rightarrow\;\) \(f\) tem um ponto de inflexão em \(a\),
- \(f''\) muda de sinal em \(a\)\(\;\Rightarrow\;\) \(f\) não tem extremo relativo em \(a\),
Esta afirmação já nos permite concluir, por exemplo, que \(f(x)=x^p\), sendo \(p\) um inteiro ímpar, tem um ponto de inflexão em \(0\).
Na próxima aula será dado um resultado que permite tirar conclusões com base no sinal das derivadas de ordem superior só num ponto \(a\).
A ideia de assintota é, de alguma forma, dar sentido à ideia de "tangente ao gráfico da função no infinito".
Consideramos:
Uma assíntota horizontal ou oblíqua diz-se assíntota à direita ou assíntota à esquerda consoante o limite é calculado quando \(x\to +\infty\) ou quando \(x\to -\infty\), respectivamente.
- assíntotas verticais: o gráfico de \(f\) tem assíntota vertical \(\;x=a\;\) (\(a\) finito) se, \[\lim_{x\to a^+}f(x)=\pm\infty,\quad\text{ ou }\quad \lim_{x\to a^-}f(x)=\pm\infty.\]
- assíntotas horizontais: o gráfico de \(f\) tem assíntota horizontal \(\;y=b\;\) (\(b\) finito) se, \[\lim_{y\to +\infty}f(x)=b ,\quad\text{ ou }\quad \lim_{y\to -\infty}f(x)=b.\]
- assíntotas oblíquas: o gráfico de \(f\) tem assíntota oblíqua \(\;y=mx+b\;\) (\(m, b\) finitos) se, \[\lim_{x\to +\infty}(f(x)-mx-b)=0 ,\quad\text{ ou }\quad \lim_{x\to -\infty}(f(x)-mx-b)=0.\] É claro que as assíntotas horizontais são casos particulares destas (fazendo \(m=0\).)
A ideia de uma assíntota oblíqua é que a distância entre o gráfico da função \(f(x)\) e essa recta é um infinitésimo quando \(x\to \pm\infty\). Qualitativamente, para \(x\) muito grande (assíntota à direita), o gráfico da função e a recta "praticamente não se distinguem".
Se existir uma assíntota oblíqua à direita, as expressões para determinar \(m\) e \(b\) são \[m=\lim_{x\to +\infty}\frac{f(x)}{x},\qquad \text{ e }\qquad b=\lim_{x\to +\infty}(f(x)-mx).\] Por outro lado, para se saber se existe uma assíntota oblíqua à direita, calcula-se primeiro o limite da expressão de \(m\) e, em seguida, o limite da expressão de \(b\). A função tem uma assíntota oblíqua à direita se ambos estes limites existem e são finitos.
Para assíntotas à esquerda è semelhante, mas agora com \(x\to -\infty.\)
\(\displaystyle f(x)=xe^{1/x}\,:\quad\) 2 aulas atrás vimos que \(\;f(0-)=0\;\) e \(\;f(0+)=+\infty.\;\) Logo, \(f\) tem uma assíntota vertical (à direita): \(\;x=0.\)
Como, \[\lim_{x\to +\infty}f(x)=(+\infty)e^0=+\infty\quad\text{ e }\quad\lim_{x\to -\infty}f(x)=(-\infty)e^0=-\infty,\] a função não tem assíntotas horizontais. Vejamos se tem assíntota oblíqua à direita: \[m=\lim_{x\to +\infty}\frac{f(x)}{x}=\lim_{x\to +\infty}e^{1/x}=1\,,\qquad b=\lim_{x\to +\infty}(f(x)-mx)= \lim_{x\to +\infty}x(e^{1/x}-1)=\lim_{y\to 0^+}\frac{e^y-1}{y}=1.\] Logo, \(f\) tem assíntota oblíqua à direita: \(y=x+1\). Verifique que também é assíntota à esquerda.
\(f(x)=x\operatorname{arctg}x\,:\quad\) Como é contínua em \(\mathbb{R}\) não pode ter assíntotas verticais. Por outro lado, \[\lim_{x\to +\infty}f(x)=(+\infty)\cdot\frac{\pi}{2}=+\infty\,,\qquad \lim_{x\to -\infty}f(x)=(-\infty)\left(-\frac{\pi}{2}\right)=+\infty\,.\] Logo, \(f\) também não tem assíntotas horizontais. Vejamos se tem assíntota oblíqua à direita: \[m=\lim_{x\to +\infty}\frac{f(x)}{x}=\lim_{x\to +\infty}\operatorname{arctg}x=\frac{\pi}{2}\,,\] \[b=\lim_{x\to +\infty}(f(x)-mx)=\lim_{x\to +\infty}x\left(\operatorname{arctg}x-\frac{\pi}{2}\right) =\lim_{x\to +\infty}\frac{\operatorname{arctg}x-\frac{\pi}{2}}{\frac{1}{x}}\stackrel{RC}{=} \lim_{x\to +\infty}\frac{\frac{1}{1+x^2}}{-\frac{1}{x^2}}=-1.\] Logo, \(f\) tem a assíntota à direita \(\;y=\frac{\pi}{2}x-1\). Como exercício mostre que tem a assíntota à esquerda \(y=-\frac{\pi}{2}x-1\).
Já temos as ferramentas que nos permitem fazer o estudo completo de uma função:
Nesta fase do estudo é extremamente importante que façam autónomamente o estudo das funções da ficha 8 das aulas de problemas. Pode previamente estudar os exercícios resolvidos da lista [EF].