Aula teórica 24

Polinómios de Taylor (conclusão).
Aplicação ao estudo de extremos relativos.

Primitivas (início).
Propriedades das primitivas.
O conjunto das primitivas de uma função.
Primitivação imediata.

Material de estudo:

Observação: O texto [AB] tem, na parte da primitivação, uma abordagem um pouco diferente da deste curso: a primitivação surge depois de introduzido o conceito de integral. No final, os conteúdos serão os mesmos. No entanto, para efeitos de programação das aulas e orientação do estudo faz-se, nestes guias, uma apresentação completa da matéria das aulas teóricas. Estes textos poderão ser usados como base de estudo.

A mesma observação pode ser feita relativamente às aulas digitais do Pro. Miguel Abreu.

Polinómios de Taylor (conclusão)

Aplicação ao estudo de extremos.

Com base na determinação dos intervalos de monotonia já temos uma forma de classificar os extremos relativos. Esse estudo envolve o conhecimento das propriedades da função, não só no ponto que se está a estudar, mas também num intervalo aberto que contenha esse ponto. O polinómio de Taylor fornece um método alternativo que nos permite saber sob determinadas condições se um ponto é de extremo ou não e, em caso afirmativo, classificá-lo, apenas com o conhecimento das derivadas nesse ponto.

Começemos por relembrar que \(f'(a)=0\) não garante que \(f\) tenha extremo relativo no ponto \(a\). Pensem, por exemplo, em \(f(x)=x^3\) no ponto \(a=0\). No entanto, já sabemos, com base nas concavidades, que se \(f''\) é contínua (\(f\) de classe \(C^2\)), então, \[f'(a)=0\quad \wedge\quad f''(a)\not=0\quad \Rightarrow\quad f \text{ tem extremo relativo em }a,\] sendo que, esse extremo relativo será mínimo relativo se \(f''(a)\gt 0\), ou máximo relativo se \(f''(a)\lt 0.\) Portanto, nestes casos, o conhecimento das duas primeiras derivadas no ponto \(a\) resolve o assunto.

Por outro lado, suponhamos que temos \(f'(a)=f''(a)=0.\) Neste caso, esta informação não é suficiente para determinar a natureza de \(a\) quanto a ser um ponto de extremo ou não, como se pode constatar dos exemplos \(x^3\), \(x^4\) e \(-x^4\) em \(a=0\): no primeiro não é ponto de extremo, no segundo é mínimo, no terceiro é máximo, como facilmente se pode constatar com base nos intervalos de monotonia.

Consideremos, como no exemplo \(f(x)=x^3\) com \(a=0\), que \(f\) é de classe \(C^3\), \(f'(a)=f''(a)=0\) e \(f'''(a)\gt 0.\;\) Então, \(f''(x)\) é estritamente crescente numa vizinhnaça de \(a\) e, como \(f''(a)=0\), temos que, nessa vizinhança, \(f''(x)\lt 0\) se \(x\lt a\) e \(f''(x)\gt 0\) se \(x\gt a\). Mas então, também nessa vizinhança, teremos \(f'(x)\) estritamente decrescente se \(x\lt a\) e estritamente crescente se \(x\gt a\). Como \(f'(a)=0\), concluimos que \(f'(x)\gt 0\), tanto se \(x\lt a\) como se \(s\gt a\). Como \(f\) é contínua em \(a\) (porque é diferenciável) concluimos que \(f\) é estritamente crescente numa vizinhança de \(a\).

Se aplicarmos argumento semelhante ao caso \(f'''(a)\lt 0\) concluimos que \(f\) é estritamente decrescente numa vizinhança de \(a\)

Conclusão: \[f'(a)=f''(a)=0\quad \wedge\quad f'''(a)\not=0\quad \Rightarrow\quad f \text{ não tem extremo relativo em }a.\] Neste caso, como vimos no argumento atrás, a concavidade muda em \(a\), pelo que \(a\) é um ponto de inflexão de \(f\)

E se tivermos \(f'(a)=f''(a)=f'''(a)=0\) com \(f^{(4)}(a)\not=0\), e assim por diante? Temos então um resultado geral que nos é dado pelo Teorema de Taylor. Relembremos este resultado aplicado a uma função \(f\) de classe \(C^{n+1}\) num intervalo \(I\) e \(a\in I\), já incorporando na fórmula o resto de Lagrange: \[f(x)=f(a)+f'(a)(x-a)+\frac{f''(a)}{2!}(x-a)^2+\dots+\frac{f^{(n)}(a)}{n!}(x-a)^n+\frac{f^{(n+1)}(c_x)}{(n+1)!}(x-a)^{n+1}\,,\] para todo \(x\in I\), onde \(c_x\) é um ponto dependente de \(x\), entre \(a\) e \(x\).

Temos então o seguinte resultado:

Teorema. Seja \(f\) de classe \(C^{n+1}\) num intervalo \(I\), \(a\in I\), \[f'(a)=f''(a)=\dots=f^{(n)}(a)=0\quad\text{ e }\quad f^{(n+1)}(a)\not=0\,.\] Então,

Demonstração:

Nas condições do teorema, para todo \(x\in I\) teremos, usando a fórmula de Taylor atrás, \[f(x)=f(a)+\frac{f^{(n+1)}(c_x)}{(n+1)!}(x-a)^{n+1}\,.\] Por outro lado, sendo \(f^{(n+1)}\) contínua por hipótese, temos que para todo o \(x\) numa vizinhança de \(a\), \(f^{(n+1)}(c_x)\) tem o mesmo sinal que \(f^{(n+1)}(a)\) (relembre que \(c_x\) está entre \(a\) e \(x\)). Então, para \(x\) nessa vizinhança temos os seguintes casos:

Ou seja,

Exemplos

  1. \(f(x)=x-\operatorname{sen} x.\;\) Então \(f'(x)=1-\cos x,\quad f''(x)=\operatorname{sen}x,\quad f'''(x)=-\cos x.\)

    Pontos críticos: \(f'(x)=0\; \Leftrightarrow\; 1-\cos x=0\; \Leftrightarrow\; x=2k\pi,\; k\in\mathbb{Z}.\)

    Como, \(f''(2k\pi)=0\) e \(f'''(2k\pi)=-1\not=0\), resulta que \(f\) não tem extremos relativos e tem pontos de inflexão em \(a=2k\pi,\; k\in\mathbb{Z}\).

  2. \(f(x)=2\cos x+x^2.\quad\) Então, \(f'(x)=-2\operatorname{sen}x+2x,\quad\)\( f''(x)=-2\cos x+2,\quad\)\( f'''(x)=2\operatorname{sen}x,\quad f^{(4)}(x)=2\cos x.\)

    Como \(f'(0)=f''(0)=f'''(0)=0\) e \(f^{(4)}(0)=2\gt 0\,,\) concluimos que \(f\) tem mínimo relativo em \(a=0\).

  3. \(f(x)=10x^6-24x^5+15x^4-1.\quad \). Mostre que tem os pontos críticos \(x=0\) e \(x=1\).

    Constate que \(f''(0)=f'''(0)=0\;\) e \(\; f^{(4)}(0)=360\), concluindo que \(f\) tem um mínimo relativo em \(0\), e que \(f''(1)=0\;\) e \(f'''(1)=120\), concluindo que \(f\) não tem extremo relativo em \(1\) mas sim um ponto de inflexão.

Primitivas (início)

Primitivar é reverter o processo de derivação: \[f'(x)\stackrel{P}{\longrightarrow} f(x).\] Por exemplo, dizemos que \(4x^3\) é primitiva de \(x^4\) porque \((x^4)'=4x^3\) e escrevemos \(P(4x^3)=x^4.\)

Definição. Uma função \(f\) diz-se primitivável num conjunto \(D\) sse existe uma função \(F\) tal que, para todo \(x\in D\), \[F'(x)=f(x).\] A função \(F\) designa-se por primitiva de \(f\) em \(D\) e representa-se por \[F(x)=Pf(x)\,\qquad \text{ou}\qquad F(x)=\int f(x)\,dx\]

A notação \(\int f(x)\,dx\) será explicada noutra aula em que se esclarecerá a relação entre primitiva e integral.

Assim, por exemplo, escreveremos \[P(4x^3)=x^4\qquad\text{ou}\qquad \int4x^3\,dx=x^4.\]

A primitiva não é única. Por exemplo, é tão correcto considerar-se a primitiva anterior como considerar \[P(4x^3)=x^4+1.\] Para o confirmar veja que se derivarem o lado direito obtêm a mesma função que se está a primitivar. Surge então a questâo: quais são todas as primitivas de uma função? Vejamos dois aspectos:
  1. Seja \(I\) um intervalo aberto e seja \(F(x)\) uma primitiva de \(f(x)\) em \(I\), ou seja, \(F'(x)=f(x)\) para \(x\in I\). Seja \(C\) uma constante. Então \((F(x)+C)'=F'(x)=f(x)\), e portanto \(F(x)+C\) é outra primitiva de \(f\) em \(I\). Ou seja,

    Somando uma constante arbitrária a uma primitiva de \(f\) em \(I\), obtemos outra primitiva de \(f\) em \(I\).

  2. Seja \(G(x)\) outra primitiva de \(f(x)\) em \(I\). Então, \((F(x)-G(x))'=F'(x)-G'(x)=f(x)-f(x)=0\). Como consequência do teorema de Lagrange (relembre Corolário 3 da aula 19) temos então que, \(F(x)-G(x)\) é constante em \(I\), ou seja, \(G(x)=F(x)+C\). Conclusão:

    Não há mais primitivas em \(I\) do que aquelas que se obtêm somando uma constante arbitrária a \(F(x)\).

Juntando as duas conclusões anteriores:

Proposição. Seja \(I\) um intervalo aberto e \(f\) uma função primitivável em \(I\). Dada uma primitiva arbitrária de \(f\) em \(I\), \(Pf(x)\), as primitivas de \(f\) em \(I\) são todas as funções que se escrevem como \[Pf(x)+C,\] para todo \(x\in I\), com \(C\) constante. Esta expressão designa-se por primitiva geral de \(f\) em \(I\).

Por vezes, pode ser pedido que se determine \(C\), por forma a que seja satisfeita uma condição imposta como um limite ou o valor da primitiva num ponto dado.

Exemplos.

  1. \(f(x)=1\) (constante em \(I\)). Temos então \(P(1)=x\) e a primitiva geral de \(f\) em \(\mathbb{R}\) é \(F(x)=x+C.\)

    Questão: qual é a primitiva \(F\) que satisfaz \(F(1)=2\)? Temos então \(1+C=2\) e, portanto, \(C=1.\) Resposta: \(F(x)=x+1.\)

  2. Determinar \(F\) tal que, \(F'(x)=3x^2\) e \(F(0)=5\). Temos, \(P(3x^2)=x^3\) e, portanto, \(F(x)=x^3+C\) com \(F(0)=C=5\). Logo, \(F(x)=x^3+5.\)

  3. Calcular \(F\) tal que \(F'(x)=e^x\) e \(\displaystyle\lim_{x\to -\infty}F(x)=1\). É óbvio que \(P(e^x)=e^x\). Logo, \(F(x)=e^x+C\), com \(\displaystyle\lim_{x\to -\infty}F(x)=0+C=1\). Logo, \(F(x)=e^x+1.\)
No caso em que o domínio de \(f\) é uma união de intervalos abertos disjuntos, sabemos que, em cada um desses intervalos a primitiva geral é da forma \(Pf(x)+C.\) No entanto, a constante não tem que ser a mesma em todos os intervalos.

Exemplo:

Determinar a função \(F\) que satisfaz \(F'(x)=-\dfrac{1}{x^2}\), para \(x\not=0\), \(F(-1)=2\) e \(F(1)=0\).

Como \(P(-\dfrac{1}{x^2})=\dfrac{1}{x}\), a expressão geral das primitivas \(F\) é \[F(x)=\begin{cases}\dfrac{1}{x}+C_1&\text{se }x\lt 0\\ \\ \dfrac{1}{x}+C_2&\text{se } x\gt 0, \end{cases}\] onde \(C_1,C_2\) são duas constantes arbitrárias.

De \(F(-1)=-1+C_1=2\) resulta \(C_1=3\) e de \(F(1)=1+C_2=0\) resulta \(C_2=-1\). Resposta: \[F(x)=\begin{cases}\dfrac{1}{x}+3&\text{se }x\lt 0\\ \\ \dfrac{1}{x}-1&\text{se } x\gt 0, \end{cases}\]

Propriedades gerais das primitivas

As propriedades das primitivas são consequências das propriedades das derivadas. Assim é fácil constatar, que, se \(f,g\) forem duas funções primitiváveis e \(c\) uma constante, \[P(f(x)+g(x))=Pf(x)+Pg(x),\qquad P(cf(x))=cPf(x)\]

Exemplo:

Usando a notação de integral (convem habituarem-se a usar as duas notações) \[\int (5\cos x+2e^x)dx=5\int\cos x\,dx+2\int e^x\,dx=5\operatorname{sen}x+2e^x. \] Para confirmar que a expressão obtida é, de facto uma primitiva de \(5\cos x+2e^x\) basta derivá-la.

Primitivas imediatas

Uma lista de primitivas é uma lista de derivadas invertida. A seguinte lista contem as primitivas mais simples a partir das quais calcularemos outras usando os métodos que veremos nas próximas aulas. Aliás, nos exemplos anteriores já vimos algumas. Obtenha esta lista por derivação das expressões da direita. Veja, em especial que, \((\ln|x|)'=\dfrac{1}{x}\) (veja separadamente os casos \(x\lt 0\) e \(x\gt 0\)).

Exemplo:

\[P\left(\frac{5}{\sqrt{x}}-\frac{3}{x}+\frac{2}{1+x^2}\right)= 5P\left(x^{-1/2}\right)-3P\left(\frac{1}{x}\right)+2P\left(\frac{1}{1+x^2}\right) \]\[=5\frac{x^{1/2}}{1/2}-3\ln|x|+2\operatorname{arctg}x=10\sqrt{x}-\ln|x|^3+2\operatorname{arctg}x.\]